terça-feira, 9 de junho de 2009

Canção de ninar na noite imensa e misteriosa da Bahía

Noiva. Antes que ela aparecesse ele nunca pensara nesta palavra: noiva. Gostava de derrubar negrinhas no areal. De encostar peito com peito, cabeça com cabeça, pernas com pernas, sexo com sexo. Mas nunca pensara em deitar na areia ao lado de uma menina, menina como ele, e conversar de coisas tolas e comer picula como os outros meninos, sem a derrubar para fazer o amor. Era outra maneira do amor, pensava numa confusão. Ele nunca tivera uma ideia perfeita do amor. Que era ele senão uma criança abandonada nas ruas, que pela força e agilidade e coragem conseguira chefiar o grupo mais valente de meninos abandonados, os Capitães da Areia? Que podia saber do amor? (...)
Noiva. Gostaria sim. Mesmo quando quer negar a si próprio não pode. É verdade que nada faz para isso, que se contenta de conversar com ela, de ouvir a sua voz, pegar timidamente na sua mão. Mas gostaria de possuí-la também, de vê-la gemer de amor. Não, porém, por uma noite. Por todas as noites de toda uma vida.

Voz de Pedro Bala, in Capitães da Areia, de Jorge Amado

Acabei o livro do Amado. As crianças (mal) amadas da Bahía ficarão para sempre dentro de mim, sendo ninadas na sua noite escura...

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