quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Migalhas de SOL

No veludo dos cabelos que partem
Penso em ti

Dentro dos desertos do quotidiano
tão áridos - como esta sede
que não se sacia -

nos perfis inacabados
de quem nunca se conheceu
ou ousou descobrir

penso em ti

desde sempre
que me acompanhas
em águas mais límpidas
que as conversas
sem fronteiras

resides na minha
vida nómada
que se impõe
em todos os serões televisivos
em cada montanha
que escalo todos os dias

em ti
que mergulhaste por todos
os mares
sem nunca teres viajado
ao fundo
do meu oceano

em ti
ausente em todas
as minhas auroras de carvão
tão somente sós

surpreende-me a magia
do silêncio
do sol que me deixas

penso em ti
e em mim

sambando
até ao próximo
eclipse

Virgínia Silva

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

"Meu ser vive na Noite e no Desejo. Minha alma é uma lembrança que há em mim."

Num encontro de seres afinados - entre um astronauta e uma (?) - tudo pode acontecer, o mundo torna-se pequenino e as essências expandem-se, trocam-se. E surgem reflexões...
Nós somos seres paradoxais, pluridimensionais, mas estamos sempre a estabelecer-nos fronteiras interiores - já para não falar das exteriores. Temos a pretensão de nos conhecermos, de nos arrumarmos em gavetas e de nos etiquetarmos como racionais ou emocionais, mentais ou físicos, nómadas ou sedentários, viajantes ou entediantes ... resultados de uma escola formatizada de dictomias, de ditaduras sociais, de ideias de seres humanos, supostamente reputados no seu conhecimento, que as cinzelaram no nosso inconsciente colectivo. Cárceres do espírito.
É difícil derrubar fronteiras, sem nos derrubarmos. É doloroso seguirmos o nosso caminho, solitários, sem cortarmos laços de ilusão. Amores sentidos, mas ilusoriamente compatíveis. Amizades profundas, mas perdidas em alguma ramificação não vista, em algum sinal que preferimos ignorar. "Talvez já não tenhamos muito em comum." - uma frase espetada no silêncio daquela noite - luminosa - mas varrida para outro lugar cá dentro que não magoe.
Era bom agirmos como a natureza "que não se incomoda com a nossa presença, mas também não nos pede para ficarmos". Era bom que as palavras terminassem no desejo sem lembranças.
Talvez o vulcão que reside em nós seja tão poderoso, tão maravilhoso, tão feliz... que é menos aventuroso extingui-lo porque não estamos habituados a ser felizes. Para ser feliz é preciso ser.
Seremos mais felizes sem limites ou ilimitados? Escalando a montanha em círculos, a medo, ou sem mapa, sem o objectivo do cume? Sempre a descobrir novos paradoxos, que só vislumbram a riqueza que somos. Como nós essencialmente somos. Seres em regresso, seres sujos de frases feitas e gestos clandestinos, instalados em nós por sedução subtil e violenta. Seres que precisam de desaprender para se reencontrar.
Seres em revolução.

Hoje é - por sintonia - o aniversário de um "homem de espírito". Parabéns Davide!

sábado, 16 de agosto de 2008

Flores de plástico

Eu sou da Era dos Sentimentos

da mesma era
em que as palavras
explodiam
cá dentro
dizimando dúvidas
ou ilusões

em que os adeuses
se concretizavam
com cartas
ou bilhetinhos sentimentais

da era do sangue
dos copos partidos
das lágrimas inacabadas
da ausência de apetite
para viver e existir

Eu pertenço à Era Sensível

os pontapés nas pombas
ainda me magoam
a mão estendida na rua
dá um nó no meu peito

e o meu coração encolhe
quando me oferecem
flores de plástico

Virgínia Silva

sábado, 9 de agosto de 2008

8-8-8


Dizem que é uma data simbólica. Dizem que é uma data importante. Que a humanidade entra numa Nova Era. Uma Era de Consciência. De maior e melhor desenvolvimento do ser humano.
Esta semana estive no Andanças - festival de danças tradicionais do mundo. Dancei italianas do sul, cabo verdianas, afro tribais... aquelas que têm mais vida e sabor. Aquelas que mexem mais cá dentro, que nos levam a estados de transe, de desbloqueios. Foi bom, a companhia foi divertida, os encontros foram (in)esperados e os desencontros úteis. Mas o meu ser está em crise. Está a pôr em causa as suas reais motivações e interesses. A sua missão na vida.
Algures fora do festival, em andanças para o Poço Azul, encontrei este lugar escondido. Veio-me à memória outro lugar semelhante, onde passei os meus pedacinhos mais recônditos e felizes. Os mais essenciais, que ficaram na aldeia de Oliveira, nos campos e na eira da quinta dos meus avós. Acho que o caminho é por aí. É o caminho que se faz por dentro. Este caminho está cruzado com o pronunciado pelo Dada, em Sintra, há 6 anos: "Há pessoas que sobem a montanha na vertical, tu sobes em círculos". Ele tem razão. Ele tenta abrir uma escola em Portugal para uma educação para a consciência, para valores mais sábios, veiculados com o tantra yoga.
O que eu sei e sinto é que preciso de reservar mais tempo para conversar comigo - algo que tenho feito muito pouco ultimamente - e isso é mesmo importante.
Foi bom viver com a Itália, com as carbonaras, as graças e as inovações em casa. Viver com a criatividade e o humor. Com a fantasia. Agora é preciso voltar a viver com a essência.
Dizem que nesta data se vai abrir o portal. Que isso pode causar crises que trazem revoluções. Talvez seja por isso que me sinto assim. Que continue a crise e que o cerne de toda a revolução - a mudança - se realize.