domingo, 23 de março de 2014

Sommarlek


O filme não me sai da cabeça. Há muito que um filme não me saía da cabeça... deve ser a diferença entre um filme que se vê e o filme que nos vê. Foi o que aconteceu com "Um verão de amor" de Ingmar Bergman, que se tornou, da noite para um novo dia, um dos filmes da minha vida. Uma história bela, com personagens graciosos, desde a bailarina imaculada, à mulher de negro do bosque. A história, muito comum e simples - dois jovens que descobrem o amor num verão - transforma-se numa viagem à nostalgia e ao interior da dor, do silêncio imenso que nos envolve, da morte que nos acompanha.
Como em muitos filmes de Bergman, o esplendor da felicidade só atinge a sua beleza máxima quando o trágico acontece. A tristeza emerge dessas águas de amor dourado, aparentemente calmas, e ouve-se o grito premonitório da coruja. Foi este grito familiar que ressoou nas minhas memórias, transportando-me à época em que (sobre)vivia aos sorrisos do mundo que continuava, ainda que parado em mim.
Tal como a bailarina - tal como demasiados nós -  pomos a maquilhagem e entramos em cena. Agimos por um instinto qualquer de preservação da alma, acreditando que "o espectáculo tem de continuar", optando por dormir com as pestanas postiças.
Até que uma noite, na solidão fantasmagórica do teatro, alguém nos surge do outro lado da imagem:"Só quando nos libertamos de todos os muros podemos ver-nos ao espelho."


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